quarta-feira, 16 de junho de 2021

JACÓ E ESAÚ em Bíblia e Psique (Edward F. Edinger)

A nossas raízes no que diz respeito a relação que estabelecemos com nossa espiritualidade, está sustentada, também, nesses compromissos que se relacionam a história de Jacó e Esaú. Uma perfeição inatingível e uma identificação com o divino que apenas nos leva à negação de algo substancial à nossa integridade. E enquanto não reconhecermos e integrarmos esses movimentos íntimos em nós, estaremos girando nessa roda interminável de conflitos violentos e destrutivos, seja individual ou coletivamente. Sendo que estes impulsos destrutivos, estarão agindo de forma livre (inconsciente), através de uma possessão ou de um complexo que nos toma e nos imprime a missão de destruir e não de construir ou criar, o realmente, novo. Apenas sentindo o estudo ou refletindo, mas ainda acolhendo e buscando a lúcida compreensão. (Kátia de Souza)

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🦋"A estória de Jacó e Esaú indica que o ego destinado à individuação nasceu como gêmeos. Outros exemplos da mesma imagem arquetípica são Rômulo e Remo e os dióscuros, Castor e Pólux. Essa divisão em dois tem dois aspectos: ego e sombra, e ego e si-mesmo. Ambos os aspectos aparecem nas relações de Jacó e Esaú."
 
🦋"Embora no início de Israel esses opostos devessem estar separados, no fim eles deveriam ser unidos. Por esse motivo um comentário rabínico diz "o Messias filho de Davi não virá antes que as lágrimas de Esaú deixem de correr."

🦋Conforme previsto por Iahweh (Gn 25,23) e com conivência de sua mãe Rebeca, Jacó roubou o direito de primogenitura e a benção paterna que pertencia a Esaú. Existe um crime no início da história de Israel. As implicações psicológicas desse crime primordial foram claramente elaboradas num estudo excelente de Myron Gubitz. A ideia básica é que o ego estabelece sua existência única e autônoma através de uma negação e dissociação da sombra. Isso, porém, acarreta um alto preço a ser pago. Conforme Gubitz, Amalec, o neto de Esaú, torna-se a incorporação da sombra dissociada na psique judaica coletiva como uma consequência do crime cometido contra Esaú. Os amalecitas guerreram contra Israel e, em resposta, Moisés anunciou que "Iahweh guerreará contra Amalec de geração em geração" (Ex 17,16). O crime não reconhecido contra Esaú estabeleceu uma culpa dissociada e um complexo de vingança que põe os descendentes de Jacó em antagonismo permanente contra os descendentes de Esaú.

🦋"O crime não reconhecido contra Esaú estabeleceu uma culpa dissociada e um complexo de vingança que põe os descendentes de Jacó em antagonismo permanente contra os descendentes de Esaú. Segundo Gubitz:

🦋"Em termos psicológicos a ansiedade a respeito de violência ou destruição iminente (em caso extremo a paranoia) geralmente está ligada a profundo sentimento de culpa. Frequentemente, também, essa culpa é o outro lado de uma inflação psíquica, de uma superioridade com um arquétipo poderoso. Na história mítica do povo judaico ambos os fatores podem ser rastreados na ruptura entre Jacó e Esaú, e posteriormente, através dos tempos, na ramificação mítica de Amalec. A culpa na psique judaica coletiva é o preço inevitável pago pelo roubo que Jacó-Israel fez do direito de primogenitura de Esaú, por sua fraudulenta aquisição da benção paterna, e por sua rejeição consciente dos aspectos e valores incorporados por Esaú. Nos termos da forma de consciência básica da cultura judaico-cristã isso pode ter sido um passo à frente, um movimento para longe do que é puramente terrestre, irracional e politeístico, em direção a um plano de espiritualidade e moralidade. Mas, como Herman Hesse nota em "O jogo das contas de vidro:

🦋Entre as angústias inerentes a uma vocação genuína, estas são as mais amargas. Quem recebeu o chamado, recebe, ao aceita-lo, não só um dom e uma ordem, mas também algo semelhante a uma culpa."

🦋O que distinguia os israelitas de outros povos num estágio primitivo era seu compromisso com a exclusividade do monoteísmo, sua identificação com Iahweh e sua meta de perfeição psíquica inevitável de tal compromisso perfeccionista - de qualquer compromisso inadequado com uma meta que é por definição inatingível - é uma estrutura de culpa completamente ramificada. Esforçando-se avidamente para atingir o brilho de uma espiritualidade transcendente, a pessoa se torna culpada por desprezar a base terrestre que dá origem e alimentação a toda a vida. Ao sentir-se a si próprio como o representante humano de Deus na terra, o indivíduo também toma sobre seus próprios ombros o fardo das falhas da humanidade e, ao mesmo tempo, também a culpa pela incapacidade humana de corresponder ao ideal divino de perfeição. Possuído por um arquétipo imensamente poderoso, e por causa disso apartado do resto da humanidade como o Escolhido de Deus, o indivíduo deve ter a percepção inconsciente de que foi desprezado por seus irmãos de sangue, pois estar apartado também significa expor-se como alvo para enormes projeções negativas e todas as energias destrutivas que elas podem desencadear."


🌹Em Bíblia e Psique de Edward Edinger citando:
Myron B. Gubitz, "Amalek: The Eternal Adversary, p.57"___✍
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